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 ROSA BRANCA DE AMOR ENTRE POVOS






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SOCIEDADE

O FENÓMENO DOS GANGS EM ANGOLA

 

 

INTRODUÇÃO AO GANG

 

Luanda – Município de Cazenga, 11 de Setembro de …., por volta das 17 horas locais, Felisberto Gunza TCP “Man Fé”[1], de 17 anos de idade, líder do gang “Furacão Squad” foi agredido por um grupo de meliantes de um gang rival; “Terror Squad”, rachando-lhe a cabeça e mutilando-lhe várias partes do corpo com armas brancas. Escapando da fúria dos agressores rivais, Man Fé reuniu urgentemente o seu staff. Motivo: Planificar uma retaliação imediata sem piedade.

 

Por volta das 19:00’ a gang “Furacão Squad” invade o território inimigo e instala-se o pânico. Segue-se uma luta sangrenta e mortífera. Resultado: Aguinaldo Barros TCP “Safodas”[2] foi atingido mortalmente. A polícia local chamada a intervir não conseguiu deter os contendores. Todavia, as investigações continuam.

 

Cambuâ Louco[3], era um jovem que frequentava um desses gangs, chamado assim porque tinha arrancado um naco de carne do braço de um companheiro, quando este lhe quis roubar um pacote de liamba, enquanto dormia nas arcadas do prédio CUCA no Kinaxixi, na baixa da capital. Já não regulava muito bem da cabeça, mas era um perigoso, já levava muitos assaltos e até mortes e violações no seu cadastro. Drogava-se com Libanga (cocaína misturada com outras drogas pesadas, droga que começou a aparecer em todos os sítios da Luanda nocturna e ultimamente nos mercados do Cazenga). Dizia ele, que tinha ficado assim, porque incarnou o espírito do seu avô, feiticeiro e fundador de uma seita misteriosa que actuava de noite, as sessões eram à porta fechada, onde os crentes se despiam ao som dos Ngomas (tambores), dançando e gritando até ao chegar do Sol, incluindo mulheres e crianças. O espírito do tal avô tinha entrado na sua cabeça e lhe ordenava coisas estranhas para fazer. Para afastar os espíritos maus tinha que boiar. Andou muito tempo a bater a zona das bombas de gasolina da Avenida Comandante Jika, vendendo de dia, cigarros e discos, e à noite, droga, Viagra e filmes pornográficos. Numa noite, apareceu baleado, ninguém sabe como foi, se foi um gang rival ou a polícia. Morreu um bandido, mas apareceram muitos mais para o substituir.

 

Infelizmente, cenas como essas têm acontecido quase todos os dias nas diversas comunidades angolanas. Os gangs constituem-se num problema social pouco ou nada discutido no âmbito institucional e social. Na tentativa de fornecer alguns elementos para a reflexão e compreensão desse problema, apresento a seguir um estudo realizado no Estabelecimento Prisional de Viana, junto dos integrantes de diversos gangs existentes nesta Urbe de Luanda, que constitui um retrato da situação global do País. O presente estudo tem o fito de desencadear uma ampla discussão a partir das seguintes perguntas: O que é um gang? Quais as suas principais característica? Principais motivos para integrar um gang. Que consequências esses agrupamentos sociais trazem aos seus membros e à sociedade? Por que é considerado um problema em nossa sociedade?

Preferi usar a palavra gang na sua originalidade e não gangue como aparece em certos livros e manuais, para dar uma certa ênfase a esse fenómeno que de forma directa ou indirecta tem nos afectado todos.

O presente estudo é apenas um cheirinho. Desafio outros pesquisadores ou mesmo fazedores de opiniões para esgrimir mais sobre um fenómeno tão delicado como esse.

O que é um gang?

Gang é uma palavra de origem inglesa, que significa um bando organizado de malfeitores (criminosos), uma quadrilha. Em suma gang significa turma ou grupo.

Um indivíduo que pertence a um gang é um gangster. Ex: Os famosos gangsters de Chicago dos anos trinta do século XX. Al Capone foi um célebre gangster. 

 

De ponto de vista sociológico, os gangs evocam a ideia de grupos. O conceito de grupo social[4] é de relevante importância para a leitura desse problema enquanto um facto social[5]. “Historicamente o termo refere-se tanto a grupos criminosos como grupos de pessoas comuns. Alguns antropólogos acreditam que o gang é uma das formas mais antigas de organização humana.

Geralmente um gang é sempre ligado ao crime organizado: Tráfico de drogas, lavagem e falsificação de dinheiros, roubos e furtos qualificados, terrorismo, etc.

Mas também, alguns agentes da ordem pública usam a palavra gang para referir-se às pequenas, informais e desorganizadas ""gangs de rua"", enquanto sindicato ou crime organizado são usados para referir-se a maiores e mais poderosas organizações, como a Máfia ítalo – americana, ou Russa – Coreana.” Buscando uma definição inicial podemos dizer que gang é um grupo social composto por pessoas ou indivíduos que associados compartilham de uma identidade comum com o mínimo de estabilidade.

Quais as principais características dos gangs?

Os integrantes dos gangs interagem através de trocas simbólicas ou linguagens variadas (corporal, visual, verbal, musical e gestual), cuja finalidade principal é a violência[6]. Buscando cartografar essas linguagens ou símbolos é possível perceber que esses sujeitos sociais geralmente compartilham elementos representativos como as assinaturas (grafites e pinchasses), demarcações de lugares, expressões verbais particulares (gírias, calão), tatuagens, vestimentas, gosto musical, horários de circulação e encontros inter-grupais em lugares determinados, etc.

Assim podemos destacar como características principais dos gangs os seguintes elementos:

·         No geral, os gangs são formados por pessoas que são provenientes de estratos sociais socioeconómicos semelhantes;

·         Pertencem a grupos etários semelhantes;

·         Habitam a mesma região geográfica;

·         Possuem líderes;

·         A maioria se identifica com acções violentas ou com uma determinada ideologia.

Principais motivos para integrar os gangs

Existem vários motivos que levam os indivíduos a integrarem nos gangs. Nesse estudo, seleccionei alguns que achei pertinentes e relevantes:

1.       Pobreza

Muitos gangs existem principalmente como uma empresa de fazer dinheiro. Cometendo roubos e traficando drogas, os membros de gangs conseguem juntar quantidades relativamente grandes de dinheiro. Pessoas que têm de encarar a falta de dinheiro podem se voltar para o crime se não conseguir ganhar o suficiente com um emprego legítimo. Isso explica em parte porque os gangs existem em áreas pobres e arruinadas das cidades. No entanto, nem toda gente que é pobre se junta a um gang e nem todo membro de gang é pobre.

2.      Pressão dos amigos

Geralmente os integrantes de gangs tendem a ser jovens. Isso ocorre em parte porque os gangs recrutam adolescentes intencionalmente, mas também porque os jovens são muito susceptíveis à pressão dos amigos. Se vivem em uma área dominada por um gang ou frequentam uma escola onde há uma forte presença de um deles, eles podem achar que muitos de seus amigos estão a juntar-se a gangs. Pode ser difícil para um adolescente entender o mal que se juntar a um gang pode ocasionar se ele estiver preocupado em perder todos os seus amigos. Muitos adolescentes resistem à tentação de se juntar a um gang, mas para outros é mais fácil seguir a turma ou grupo. A pressão dos colegas é uma força motora por trás da união a gangs em áreas mais abastadas.

3.      Tédio

Sem nada para ocupar o seu tempo, os jovens às vezes escolhem a maldade como forma de se entreterem. Se os gangs já estiverem presentes na vizinhança, elas podem ser uma válvula de escape. Como alternativa, os adolescentes podem formar os seus próprios gangs. Essa é a razão pela qual muitas comunidades têm tentado combater os gangs simplesmente proporcionando algo para as crianças fazerem: campeonatos de dança, de desporto e outros programas de alcance aos jovens podem literalmente manter as crianças longe das ruas. Infelizmente, muitos jovens e até mesmo especialistas em gangs usam o tédio como uma desculpa. Autores de artigos sobre a violência dos gangs frequentemente escrevem coisas como "Não há nada mais para se fazer onde eles moram". De facto, programas de desporto para jovens, ou mesmo bibliotecas, recebem pouca ajuda ou estão frequentemente em condições precárias nas áreas urbanas mais complexas. Mas para cada adolescente que fica entediado e se junta a um gang, há dez que encontram maneiras positivas e produtivas de gastar o seu tempo.

4.      Desespero

Se pobreza é uma condição, desespero é um estado mental. Pessoas que sempre viveram na pobreza, com pais que viveram na pobreza, muitas vezes acham que não terão uma oportunidade de algum dia conseguir um emprego decente, deixar a sua vizinhança pobre ou conseguir educação. Elas estão cercadas por drogas e gangs e os seus pais podem ser viciados ou pessoas insensíveis. Um gang da vizinhança pode parecer a única família real que elas jamais terão. Juntar-se a um gang dá-lhes uma sensação de pertencer e ser parte de algo importante que elas, de outra maneira, não podem conseguir. Em alguns casos, os pais aprovam o facto de seus filhos juntarem-se a gangs e também podem ter sido membros de uma no passado.


O uso de drogas é um factor subjacente a todas essas razões. A venda de drogas ilegais não só movimenta os lucros dos gangs de rua, como também cria muitas das condições que levam à filiação a gangs.  

OS GANGS EM ANGOLA

 

Na linguagem popular angolana, a expressão gang não se utiliza muito. Porém usa-se a palavra grupo para caracterizar um gang. "Squad", é o nome dado à maior parte dos gangs juvenis da nossa cidade de Luanda, que nem sequer sabem o significado disto. Com a pobreza e o abandono institucional, os bairros com diversas precariedades são fontes e ao mesmo tempo vítimas dos gangs. Nesses lugares, onde existe pouco ou nenhum desenvolvimento comunitário ou mecanismos de promoção social, transformam-se em palco privilegiado para a instalação de situações de risco, como grupos organizados para o tráfico e uso de drogas, gerando ansiedade e medo na população local, traduzida pelo “sentimento de insegurança”. A maioria desses gangs de juvenis não tem nada, apesar de apresentar os B.I. de componentes com 16 e 17 anos, a verdade é que a maior parte deles até já têm 30 anos, bigode e barba cerrada. São jovens que já "cheiraram" de tudo, mesmo gasolina e outros materiais corrosivos.

Os gangs ou grupos mais famosos são: HDA (Homens de Artes)[7], Alameda Squad[8], Babilónia Squad, Os dibos, Os Calungas Matam, Os cabeças rapadas, Prenda Squad, Cazenga Squad, Lambas Squad, Caixão Vazio Squad, G-Unit Squad

Só em Luanda, especula-se a existência de cerca de 2000 gangs/grupos, muitos deles com ramificações em algumas províncias do interior.    

 

Conseguir estatísticas correctas sobre os gangs e filiações a eles é difícil por várias razões. Os gangs obviamente não mantêm registos oficiais de suas filiações. Algumas pessoas saem ou têm laços familiares com membros de gangs, mas, na verdade, não pertencem a um deles. Se alguém "anda" com um gang, mas ainda não foi iniciado, essa pessoa pode ser considerada um membro? Quem contar quando estiver compilando suas estatísticas? Só em Luanda, especula-se a existência de cerca de 1.800,00 gangs/grupos, muitos deles com ramificações em algumas províncias do interior.    

Também é importante considerar a fonte dos dados. Se um agente da polícia perguntar a um membro de gang/grupo: "Tu és de algum gang?", a resposta sem dúvida é não, sabendo que a polícia mantém maior vigilância sobre os membros de gang/grupo mais conhecidos. Alguns jovens chegam a dizer a outros adolescentes que pertencem a um gang para parecerem duros, enquanto os gangs podem acrescentar os números de filiados para parecerem mais poderosos. As instâncias judiciárias também nem sempre reportam as estatísticas sobre os gangs com precisão.

A actividade dos gangs aumentou gradualmente no século XX. A partir dos anos 60, a maioria dos gangs estava nos bairros periféricos das grandes cidades, embora povoações próximas e aldeias possam ter hospedado ramificações de gangs quando ligados por meio de auto-estradas importantes.

Nos anos de 80 e 90, as drogas narcóticas tornaram-se mais predominantes nas ruas. Armas de fogo também se tornaram mais fáceis de se adquirir ilegalmente. Essa combinação fez entrar para um gang de rua algo mais lucrativo e mais violento. No geral, a actividade dos gangs atingiu o pico em meados dos anos de 1992 com o recrudescimento do conflito armado em quase todo o território nacional.

A maioria dos membros de gangs é exposta a eles ainda jovem. O dinheiro e o respeito dos membros de gangs mais velhos impressionam. Eles podem começar a sair com membros de gangs, descobrir quem é importante e aprender o que o gang faz. Isso pode acontecer já por volta dos 10 ou 11 anos. Muitos gangs recrutam crianças intencionalmente e usam-nas para carregar armas e drogas ou cometer outros crimes porque elas costumam atrair menos atenção da polícia. Se forem apanhados, podem cumprir sentenças mais curtas nas esquadras da polícia do que um membro de gang adulto numa prisão.

Em Luanda, quando um indivíduo se junta ao gang, geralmente tem de passar por uma iniciação. As iniciações não envolvem cerimónias elaboradas ou formalidades, mas o iniciado terá de passar por certos rituais. O mais comum é levar uma surra dada por todos os membros do gang. Há gangs que aceitam mulheres. Às vezes violam-nas como iniciação. Em vez de levar uma surra, ou dar uma, o novo membro do gang deve participar numa missão. Pode ser qualquer coisa desde roubar um telemóvel até entrar numa briga com o gang rival. Alguns gangs não consideram ninguém como membro completo até que tenha atirado ou matado alguém. Fazer uma tatuagem com símbolos do gang pode ser uma outra parte da iniciação.

A vida diária nos gangs geralmente não é muito excitante. Os membros de gangs dormem tarde, ficam sentados nas paradas, bebem, drogam-se e possivelmente vão para um local de encontro ao entardecer, como uma praça, uma paragem de táxi. Eles podem trabalhar numa esquina da cidade vendendo drogas ou cometer crimes insignificantes como vandalismo ou roubo. A noção de fama guia a vida no gang quase completamente e, para muitos membros de gangs, ganhar fama significa cometer crimes violentos. Enquanto isso é relativamente raro comparado às outras actividades, os gangs assaltam, atiram e assassinam pessoas por dinheiro, controle de área ou orgulho.

Em Luanda, poucos são os gangs que têm influência de longo alcance, funcionando como um negócio, e às vezes são chamadas de "Grupos Tribais". Na maioria das vezes, um gang de rua tem uma hierarquia violenta baseada na experiência: membros que tenham passado um tempo na cadeia ou tenham participado em crimes sérios conseguem o maior grau de fama. No entanto, a idade frequentemente divide os gangs em grupos, com grupos sénior, júnior e iniciantes mais jovens. Os membros sénior nem sempre têm liderança sobre grupos mais jovens, tudo depende do status quo da rua.

Gangs femininos são raros e existem principalmente como ramificações de outros gangs. Por exemplo, as namoradas de membros de gangs formam o seu próprio grupo para mostrar lealdade a gang original. Mas a filiação a gangs femininos está a crescer, com gangs só de mulheres formando-se e rivalizando com gangs masculinos por área e por respeito. Alguns gangs aceitam membros independentemente de raça ou sexo.

Como se pode perceber, a ansiedade e o medo resultam do sentimento de impotência, de fragilidade. Ora, o ser humano cheio de aspirações e sem nenhum poder de realizá-las, torna-se, de uma ou de outra forma, violento. Torna-se hostil e junta-se a um gang. Pois, lá encontra indivíduos com as mesmas condições e aspirações. Corriqueiramente as autoridades policiais angolanas e os meios de comunicação costumam veicular a informação de que na periferia ou nos bairros pobres dos centros urbanos são os lugares onde a violência “é mais crua e deflagrada”. Mas, isso não quer dizer que as pessoas pobres nascem violentas. Significa, “que o grau de impotência que lhes foi imposto aflige-os de tal forma que, em certos momentos, só os actos de violência se apresentam como alternativa de libertação e sobrevivência”.

Segundo Soares, Bill, Athayde “a violência se aprende, como se aprende a praticar e orientar-se para a paz”, mas chama atenção ao fato de que também existe uma raiz biológica para a violência ao dizer que o cientista Konrad Lorenz “já nos ensinara que o ser humano é o animal mais violento, no âmbito intra-específico – ou seja, com a própria espécie”. Ainda afirma que “duas características distinguem o humano: a linguagem e a crueldade”. Sendo inegável, portanto, essa base biológica que eclode “quando o ânimo ferve e o ódio escorre, torrencialmente, impregnando os sentidos, obliterando o juízo, cegando a razão, até derramar-se sobe a forma de violência”.

Que consequências esses grupos sociais trazem para seus membros e à sociedade?

Os gangs cultivam o terrorismo, o pânico, a privação de liberdade e a morte prematura de muitos jovens. Estas são algumas das consequências que os gangs vêm operando em várias partes de Angola e do mundo. Mas é importante ressaltar que os meios de comunicação, ao tratar da questão de forma sensacionalista, tem gerado uma sensação generalizada de que a origem da violência está nos gangs formados por adolescentes e jovens e escamoteia suas verdadeiras causas e faces.

Nos Municípios de Cacuaco, Cazenga, Kilamba Kiaxi, Rangel, Samba, Sambizanga e Viana em Luanda, o fenómeno de gangs segue em expansão por serem áreas onde se concentram as populações menos favorecidas socioeconomicamente, mas nem todos os delitos que ocorrem, nessas regiões, são realizados pelos gangs. Nos Municípios considerados de elites e abastados; Ingombotas e Maianga, os poucos gangs que lá existem são paradoxalmente integrados por jovens cujos pais têm um nível de vida aceitável, e actuam por fama, excitação (prazer) e rebeldia contra os pais. Utilizam e exibem roupas de marca, carros top de gama e até grafites para se identificarem. Vários gangs nessas zonas as vezes são criados até em algumas escolas por alunos que se sentem oprimidos pelo mundo ou até as vezes por seus pais em casa, por amigos e também inimigos!

QUAL A SOLUÇÃO PARA ESSE PROBLEMA?

Para resolver o problema, os decisores políticos têm-se mostrado mais preocupado em criar ou endurecer as leis, encarcerar os prevaricadores, combater os delinquentes do que reduzir as condições de abandono e marginalidade de muitas comunidades, através de políticas públicas (saúde, educação, lazer, cultura, profissionalização, geração de renda, etc.) que possibilitem mudanças significativas no contexto social dos jovens, dotando-os de habilidades e oportunidades que facilitem sua integração. Ao mesmo tempo é preciso investir na humanização dos agentes policiais que actuam para manter a ordem pública.

Ademais, é preciso construir um ciclo de integração de habilidades, de linguagem e de comunicação capaz de propiciar caminhos para a resolução pacífica de conflitos. E que também sejam o sustentáculo para a criação de estruturas sociais que possam servir equitativamente a todos os cidadãos.

Não há maneira fácil de parar os gangs, porque as condições subjacentes que levam a eles são complexas. Repressões policiais podem temporariamente diminuir a influência dos gangs em uma área específica. No entanto, enquanto a pobreza e o desespero existirem, os gangs vão inevitavelmente recrutar novos membros para substituir aqueles que vão para a prisão. Sanções extra policiais em uma área podem simplesmente direccionar a actividade de um gang para outra área próxima.

Além do mais, uma repressão policial pode ajudar a unificar o que antes era um gang fraco e sem coesão. Sob pressão externa, os membros de gang voltam-se uns para os outros, têm mais orgulho de sua filiação a gang e tornam-se capazes de actos de violência maiores. Enquanto a presença policial é vital para manter as vizinhanças seguras, uma abordagem a longo prazo mais bem sucedida requer múltiplas tácticas que se resumem a uma única coisa: dar às pessoas algo do que viver além de um gang. Isso pode incluir ajuda aos jovens em perigo ou actuais membros de gangs para encontrarem empregos decentes ou obterem educação. Clubes de Bairro e centros comunitários unem os membros que não pertencem a gangs (a maioria das pessoas) para limpar e manter suas ruas, livrar-se de imundices e mostrar orgulho de onde vivem. Eventos comunitários como danças, jogos de futebol e noites de jogos dão à juventude algo para fazer, em vez de ficarem nas varandas com membros de gangs. Se acontecem ao ar livre, os eventos tornam essas áreas menos atractivas para a actividade de gangs, por causa da presença de todos os membros que não pertencem a eles.

Um dos métodos preferidos de supressão a gangs é o programa "Weed and Seed" (Erva daninha e Semente), concebido pelo Departamento de Justiça dos Estados Unidos de América. Ele combina sanção policial (separando os piores membros de gangs) com activismo comunitário e oportunidades económicas (dotando a vizinhança de meios para superar condições negativas). Mais de 3 mil programas "Weed and Seed" estão activos nos Estados Unidos. Cada site consegue receber até US$ 1 milhão para ajudar a fornecer fundos a "sanções da lei, policiamento da comunidade, prevenção, intervenção e tratamento e restauração da vizinhança".

Nas palavras de um ex-membro do gang Crip nos Estados Unidos, Kody Scott (que tinha o nome de Gang Monster - monstro), "Quando os membros dos gangs pararem suas guerras e acharem que não há mais necessidade desses grupos existirem, o barulho vai cessar. Mas até então, todas as tentativas de sanções das leis para reduzir seu movimento progressivo serão em vão". Gostaria de acrescentar que os gangs como grupos sociais podem continuar a surgir e existir desde que sejam para fins úteis a sociedade, para a promoção dos direitos humanos, da justiça e do desenvolvimento sustentável. E, a repressão policial é um mecanismo, porém não é o mais apropriado para combater e reduzir esse fenómeno. É preciso a adopção de Leis e Políticas mais realistas para se estancar esse fenómeno. Nesse aspecto a contribuição de todos é indispensável. Todos políticos, sociedade civil, policia, média, pais, autoridades tradicionais, fazedores de opiniões, agências internacionais, devemos participar de forma activa para direccionar e reajustar a essência dos gangs, não no cometimento do mal, da violência ou outro tipo de ilicitude, mas sim na aplicabilidade das virtudes e outros valores necessários para o desenvolvimento das nossas sociedades.

Carlos Gomes Ngondi Sucami

 



[1] Nome fictício

[2] Nome fictício

[3] Nome fictício

[4] Grupo social: expressão sociológica que significa “reunião de duas ou mais pessoas associadas pela interacção social, capaz de manter uma organização e acções conjuntas para alcançar objectivos comuns a todos os seus membros”.

[5] Facto social: segundo o sociólogo francês Emile Durkheim, “facto social é toda maneira de fazer, fixada ou não, susceptível de exercer sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, toda maneira de fazer que é geral na extensão de uma sociedade dada e, ao mesmo tempo, possui uma existência própria, independente de suas manifestações individuais”.

[6] Violência: “fenómeno gerado nos processos sociais que leva as pessoas, grupos, instituições e sociedades a se agredirem mutuamente, a se dominarem, a tomarem à força a vida, o psiquismo, os bens e/ou o património alheio”.

[7] O HDA – Homens de Arte surgiu inicialmente como um grupo cultural que com a viragem de acontecimentos, se transformou num gang perigoso e temido.

[8] Inimigo de estimação do HDA.